quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Aprender de cor quem amamos

Comportamo-nos como se as pessoas de quem gostamos fossem durar para sempre.
Em vida não fazemos nunca o esforço consciente de olhar para elas como quem se prepara para lembrá-las.
Quando elas desaparecem, não temos delas a memória que nos chegue. Para as lembrar, que é como quem diz, prolongá-las.
A memória é o sopro com que os mortos vivem através de nós.
Devemos cuidar dela como da vida.
Devemos tentar aprender de cor quem amamos. Tentar fixar.
Armazená-las para o dia em que nos fizerem falta.
São pobres as maneiras que temos para o fazer, é tão fraca a memória, que todo o esforço é pouco.
Guardá-las é tão difícil.
Eu tenho um pequeno truque. Quando estou com quem amo, quando tenho a sorte de estar à frente de quem adivinho a saudade de nunca mais a ver, faço de conta que ela morreu, mas voltou mais um único dia, para me dar uma última oportunidade de a rever, olhar de cima a baixo, fazer as perguntas que faltou fazer, reparar em tudo o que não vi; uma última oportunidade de a resguardar e de a reter.

Miguel Esteves Cardoso

domingo, 11 de agosto de 2013

Assim é Minha Vida

Assim é a minha vida

Meus deveres caminham com meu canto.
Sou e não sou: é esse meu destino.
Não sou, se não acompanho as dores dos que sofrem: são dores minhas.
Porque não posso ser sem ser de todos, de todos os calados e oprimidos.
Venho do povo e canto para o povo.
Minha poesia é cântico e castigo.
Me dizem: "Pertences à sombra".
Talvez, talvez, porém na luz caminho.
Sou o homem do pão e do peixe, e não me encontrarão entre os livros,
mas com as mulheres e os homens: eles me ensinaram o infinito.

Pablo Neruda